quinta-feira, 11 de outubro de 2012

Indígenas ameaçam morrer coletivamente caso ordem de despejo seja efetivada

Estava trabalhando na memória histórica dos últimos 40 anos, na perspectiva da reedição do documento Y Juca Pirama - "O Índio aquele que deve morrer". Em dezembro de 1973 foi dado esse grito, por bispos e missionários, contra o genocídio indígena em curso pelos governos da ditadura militar.
Enquanto buscava reunir denúncias e violências, mortes e massacres de povos indígenas nestes 40 anos, vejo um email, urgente do Conselho da Aty Guasu Kaiowá Guarani. Ao ler o teor do comunicado fico estarrecido e me junto ao grito dos condenados- “que país é esse?".
Diante do decreto de morte e extermínio surge a obstinada determinação dos povos de viver ou morrer coletivamente, conforme suas crenças, esperanças ou desespero. Esse grito certamente fará parte do manifesto "os povos indígenas, aqueles que devem viver", apesar e contra os decretos de extermínio.
Não podemos calar ou ficar inertes diante desse clamor da comunidade Kaiowá Guarani, de Pyelito Kue/Mbarakay, no município de Iguatemi, Mato Grosso do Sul. Não se trata de um fato isolado, mas de excepcional gravidade, diante de uma decisão de morte coletiva. Continuaremos sendo desafiados por fatos semelhantes, caso não se tome medidas urgentes de solução da questão da demarcação das terras indígenas desse povo.
O grito Kaiowá Guarani
"Sabemos que seremos expulsas daqui da margem do rio pela Justiça, porém não vamos sair da margem do rio. Como um povo nativo e indígena histórico, decidimos meramente em ser morto coletivamente aqui. Não temos outra opção, esta é a nossa última decisão unânime diante do despacho da Justiça Federal de Navirai- MS." Esse é o comunicado da comunidade indígena para o Governo e Justiça Federal.    

"Nos matem e enterrem coletivamente", gritam das margens do rio Hovy
"Comemos comida uma vez por dia. Passamos isso dia-a-dia para recuperar o nosso território antigo Pyleito Kue/Mbarakay. De fato, sabemos muito bem que no centro desse nosso território antigo estão enterrados vários os nossos avôs e avós, bisavôs e bisavós, ali estão os cemitérios de todos nossos antepassados. Cientes desse fato histórico, já vamos e queremos ser mortos e enterrados junto aos nossos antepassados aqui mesmo onde estamos hoje, por isso, pedimos ao Governo e Justiça Federal para não decretar a ordem de despejo/expulsão, mas solicitamos o decreto da nossa morte coletiva e para nos enterrar aqui. Pedimos, de uma vez por todas, para decretar a nossa dizimação/extinção total, além de enviar vários tratores para cavar um grande buraco para jogar e enterrar os nossos corpos. Esse é nosso pedido aos juízes federais.
"Já aguardamos esta decisão. Assim, se é para decretar a nossa morte coletiva Guarani e Kaiowá de Pyelito Kue/Mbarakay pedimos que nos enterrem todos aqui. Visto que decidimos integralmente a não sairmos desse local com vida e nem mortos. Sabemos que não temos mais chance em sobreviver dignamente aqui em nosso território antigo, já sofremos muito e estamos todos massacrados e morrendo de modo acelerado." (Carta da comunidade).

Ao tomar ciência do teor da carta dessa comunidade, Eliseu Lopes, da Aty Guasu/APIB comentou. "É, isso vai se repetir muitas vezes se o governo não demarcar logo as nossas terras. Quando os nossos líderes religiosos decidem retornar aos tekoha (terras tradicionais de nossas comunidades) vão mesmo e ninguém segura”. Ele lamenta profundamente se chegar a esse ponto de desespero que poderá levar a muitas mortes.

Leia a carta na íntegra

Carta da comunidade Guarani-Kaiowá de Pyelito Kue/Mbarakay-Iguatemi-MS para o Governo e Justiça do Brasil

Nós (50 homens, 50 mulheres e 70 crianças) comunidades Guarani-Kaiowá originárias de tekoha Pyelito kue/Mbrakay, viemos através desta carta apresentar a nossa situação histórica e decisão definitiva diante de da ordem de despacho expressado pela Justiça Federal de Navirai-MS, conforme o processo nº 0000032-87.2012.4.03.6006, do dia 29 de setembro de 2012. Recebemos a informação de que nossa comunidade logo será atacada, violentada e expulsa da margem do rio pela própria Justiça Federal, de Navirai-MS.

Assim, fica evidente para nós, que a própria ação da Justiça Federal gera e aumenta as violências contra as nossas vidas, ignorando os nossos direitos de sobreviver à margem do rio Hovy e próximo de nosso território tradicional Pyelito Kue/Mbarakay. Entendemos claramente que esta decisão da Justiça Federal de Navirai-MS é parte da ação de genocídio e extermínio histórico ao povo indígena, nativo e autóctone do Mato Grosso do Sul, isto é, a própria ação da Justiça Federal está violentando e exterminado e as nossas vidas. Queremos deixar evidente ao Governo e Justiça Federal que por fim, já perdemos a esperança de sobreviver dignamente e sem violência em nosso território antigo, não acreditamos mais na Justiça brasileira. A quem vamos denunciar as violências praticadas contra nossas vidas? Para qual Justiça do Brasil? Se a própria Justiça Federal está gerando e alimentando violências contra nós.  Nós já avaliamos a nossa situação atual e concluímos que vamos morrer todos mesmo em pouco tempo, não temos e nem teremos perspectiva de vida digna e justa tanto aqui na margem do rio quanto longe daqui. Estamos aqui acampados a 50 metros do rio Hovy onde já ocorreram quatro mortes, sendo duas por meio de suicídio e duas em decorrência de espancamento e tortura de pistoleiros das fazendas.

Moramos na margem do rio Hovy há mais de um ano e estamos sem nenhuma assistência, isolados, cercado de pistoleiros e resistimos até hoje. Comemos comida uma vez por dia. Passamos tudo isso para recuperar o nosso território antigo Pyleito Kue/Mbarakay. De fato, sabemos muito bem que no centro desse nosso território antigo estão enterrados vários os nossos avôs, avós, bisavôs e bisavós, ali estão os cemitérios de todos nossos antepassados.
Cientes desse fato histórico, nós já vamos e queremos ser mortos e enterrados junto aos nossos antepassados aqui mesmo onde estamos hoje, por isso, pedimos ao Governo e Justiça Federal para não decretar a ordem de despejo/expulsão, mas solicitamos para decretar a nossa morte coletiva e para enterrar nós todos aqui.

Pedimos, de uma vez por todas, para decretar a nossa dizimação e extinção total, além de enviar vários tratores para cavar um grande buraco para  jogar e enterrar os nossos corpos. Esse é nosso pedido aos juízes federais. Já aguardamos esta decisão da Justiça Federal. Decretem a nossa morte coletiva Guarani e Kaiowá de Pyelito Kue/Mbarakay e enterrem-nos aqui. Visto que decidimos integralmente a não sairmos daqui com vida e nem mortos.
Sabemos que não temos mais chance em sobreviver dignamente aqui em nosso território antigo, já sofremos muito e estamos todos massacrados e morrendo em ritmo acelerado. Sabemos que seremos expulsos daqui da margem do rio pela Justiça, porém não vamos sair da margem do rio. Como um povo nativo e indígena histórico, decidimos meramente em sermos mortos coletivamente aqui. Não temos outra opção esta é a nossa última decisão unânime diante do despacho da Justiça Federal de Navirai-MS.     

Atenciosamente, Guarani-Kaiowá de Pyelito Kue/Mbarakay

Relatório do conselho Aty Guasu explica a situação dos Guarani Kaiowá de Pyelito Kue/Mbarakay
Este relatório é do conselho da Aty Guasu Guarani e Kaiowá, explicitando a história e situação atual de vida dos integrantes das comunidades Guarani-Kaiowá do território tradicional Pyelito Kue/Mbarakay, localizada na margem de Rio Hovy, 50 metros do rio Hovy, no município de Iguatemi-MS. O acampamento da comunidade guarani e kaiowá de Pyelito Kue/Mbarakay começou no dia 08 de agosto de 2011.

É importante ressaltar que os membros (crianças, mulheres e idosos) dessa comunidade proveniente de uma reocupação, no dia 23 de agosto de 2011, às 20h00, foram atacados de modo violentos e cruéis pelos pistoleiros das fazendas. A mando dos fazendeiros, os homens armados passaram permanentemente a ameaçar e cercar a área minúscula reocupada pela comunidade Guarani-Kaiowá na margem do rio que este fato perdura até hoje.

Em um ano, os pistoleiros que cercam o acampamento das famílias guarani-kaiowá, já cortaram/derrubaram 10 vezes a ponte móvel feito de arame/cipó que é utilizada pelas comunidades para atravessar um rio com a largura de 30 metros largura e mais de 3 metros de fundura. Apesar desse isolamento pistoleiros armados ameaçam constantemente os indígenas, porém 170 comunidades indígenas reocupante do território antigo Pyelito kue continuam resistindo e sobrevivendo na margem do rio Hovy na pequena área reocupada até os dias de hoje, estão aguardando a demarcação definitiva do território antigo Pyelito Kue/Mbarakay.

No dia 8 dezembro de 2009, este grupo já foi espancado, ameaçado com armas de fogo, vendado e jogado à beira da estrada em uma desocupação extra-judicial, promovida por um grupo de pistoleiros a mando de fazendeiros da região de Iguatemi-MS. Antes, em julho de 2003, um grupo indígena já havia tentado retornar, sendo expulso por pistoleiros das fazendas da região, que invadiram o acampamento dos indígenas, torturaram e fraturaram as pernas e os braços das mulheres, crianças e idosos. Em geral os Guarani e Kaiowa são hoje cerca de 50 mil pessoas, ocupando apenas 42 mil hectares. A falta de terras regularizadas tem ocasionado uma série de problemas sociais entre eles, ocasionando uma crise humanitária, com altos índices de mortalidade infantil, violência e suicídios entre jovens.

No último mês a Justiça Federal de Navirai-MS, deferiu liminar de despejo da comunidade Guarani e Kaiowá da margem do rio Hovy solicitado pelo advogado dos fazendeiros e, no despacho cita “reintegração de posse”, mas observamos que o grupo indígena está assentado na margem do rio Hovy, ou seja, não estão no interior da fazenda como alega o advogado dos fazendeiros. De fato, não procede à argumentação dos fazendeiros e por sua vez do juiz federal de Navirai sem verificar o fato relatado, deferir a reintegração de posse. Não é possível despejar indígenas da margem de um rio. Por isso pedimos para Justiça rever a decisão de juiz de Navirai-MS.

No sentido amplo, nos conselhos da Aty Guasu recebemos a carta da comunidade de Pyelito Kue/Mbarakay em que consta a decisão da comunidade que passamos divulgar a todas as autoridades federais e sociedade brasileira.


Tekoha Pyelito kue/Mbarakay, 08 de outubro de 2012
Atenciosamente,
Conselho/Comissão de Aty Guasu Guarani e Kaiowá do MS.
Fonte: CIMI

quarta-feira, 3 de outubro de 2012

Desmatamento é o principal causador da extinção de primatas no Amazonas

Na fauna amazônica, existem cem espécies detectadas de primatas, sendo que, pelo menos, 15 correm perigo de extinção. Para combater esse problema, o Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia (Inpa) tem trabalhado em parceria com outras instituições na tentativa de conscientizar a população e fazer estudos precisos sobre o problema.

De acordo com o pesquisador do Inpa, Wilson Spironello, o principal inimigo das espécies é o desmatamento, sobretudo de macacos menores como o sauim-de-coleira, que habita regiões próximas à Manaus. “Existe uma distribuição mais restrita. Essa espécie habita um espaço com maior foco de ocupação humana”, afirma.

Desde o ano passado, o Inpa participa do Plano de Ação Nacional Para a Conservação do Sauim-de-Coleira. Spironello explica que o programa tem o objetivo de realizar um levantamento a respeito do número exato de representantes dessa espécie na floresta amazônica e estabelecer estratégias para preservar o animal. “Não temos um projeto fechado na instituição, até porque não contamos com muitos pesquisadores que trabalhem exclusivamente com primatas. É uma área muito carente”, reconhece. “Contudo, temos pesquisas independentes onde estudamos e monitoramos alimentação, ecologia dos animais, como se comportam em ambientes fragmentados, entre outros.”, acrescenta.

No caso do estudo do sauim-de-coleira, o Inpa é parceiro do Instituto Chico Mendes (ICMBIO), assim como a Universidade Federal do Amazonas (Ufam), Ministério da Ciência e Tecnologia e Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama), entre outros. “Quando você quer ter um foco em uma espécie o ideal é apresentar uma proposta para órgãos que a financiem”, destaca.

Um dos pontos que o pesquisador e especialista em primatas ressalta é a grande diversidade que a espécie apresenta na Amazônia. Os pesos, por exemplo, podem ser diversos – de 130 g até 12 kg. O peso do macaco, inclusive, é um fator importante. Primatas maiores podem ser eliminados mais rápido pela facilidade da caça. “Um exemplo é macaco barrigudo. É o maior da Amazônia, chegando a 12 kg. Já o macaco-aranha pesa de 7 a 10 kg. Esses animais precisam de ambientes bem conservados e, de preferência, distantes da civilização. O ideal é que vivam em florestas mais altas, onde não há o risco de serem caçados”, frisa Spironello.

A alimentação diversificada também é uma marca dos primatas. Enquanto o macaco-aranha e o barrigudo comem frutas e sementes, o sauim (que pesa em torno de 500g) se alimenta de insetos. “O guariba, que é um dos mais comuns em Manaus, vive com frutos, mas também come uma boa porcentagem de folhas. Mesmo sobrevivendo em um mesmo ambiente, nem todas as espécies se alimentam da mesma maneira”, acrescenta o pesquisador. (Fonte: G1)