O uso
caseiro dos óleos da floresta é uma tradição e uma riqueza cultural que
atravessou os séculos e permanece viva em toda a região
Ribeirinhos e agricultores da Amazônia estão
aproveitando as riquezas da floresta de maneira sustentável. São árvores
sementes, frutos e folhas que se transformam em perfumes, produtos de
beleza. Além de melhorar a renda das famílias, a atividade ajuda a
preservar a floresta.
A viagem em busca dos óleos da floresta começa em um dos cenários
mais bonitos da Amazônia, no município de Santarém, no estado do Pará. A
cidade charmosa, com fachadas antigas, foi construída às margens de
dois rios. De um lado, vem o Amazonas, com seu leito barrento, e, de
outro, o Tapajós, em tons de azul. O encontro das águas é um espetáculo
grandioso.
O mercado municipal de Santarém funciona todos os dias e atrai
milhares de compradores e comerciantes que chegam de todos os pontos da
região. Por estar em um lugar estratégico, no encontro do rio Amazonas
com o Tapajós, é um dos mais ricos e mais completos da Amazônia.
Tem de tudo. Pimentas coloridas e peixes, camarão de água doce e
artesanato, farinhas, frutas nativas. Entre os destaques do mercado
estão também os óleos da floresta.
Manoel da Silva, conhecido como "Raizeiro Boa Sorte" é um
especialista. Ele vende o óleo de andiroba, usado como anti-inflamatório
e repelente de insetos. O de pau rosa é utilizado tradicionalmente como
perfume. Um dos mais vendidos é o óleo de copaíba, que "serve pra
muitos tipos de doença", diz o especialista.
Esse uso caseiro dos óleos da floresta é uma tradição que atravessou
os séculos na Amazônia. Uma riqueza cultural, que permanece viva em toda
a região. De uns anos pra cá, muitos desses produtos começaram a
conquistar também compradores maiores: são indústrias que utilizam os
óleos como ingredientes para fabricação de perfumes, xampus, sabonetes,
hidratantes.
A nova fase deu impulso a uma série de projetos que estão melhorando a
qualidade de vida de milhares de famílias da região. No município de
Manicoré, estado do Amazonas, uma comunidade rural trabalha com o óleo
de copaíba.
Formada por sítios pequenos, a comunidade de Lago do Atininga reúne
140 famílias de ribeirinhos. O lugarejo conta com luz elétrica, que foi
instalada recentemente. Tem igreja e escolinha para as crianças mais
novas.Os moradores se dedicam a pesca artesanal e tocam pequenas
lavouras de mandioca. A raiz serve pra fazer farinha, beiju e outros
derivados.
A principal fonte de renda da comunidade é o extrativismo: o uso
sustentável dos recursos da floresta. Baseadas num conhecimento
tradicional, as famílias daqui exploram três produtos diferentes.
O primeiro é a castanha, fruto de uma das árvores mais altas da
Amazônia, a castanheira. O produto se desenvolve no topo, dentro de
ouriços redondos. Os ribeirinhos também coletam o látex, usado na
produção de borracha. A resina é extraída com a sangria das seringueiras
nativas. A atividade que vem mais crescendo nos últimos anos é extração
do óleo de copaíba. A coleta ocorre o ano todo em lugares distantes, na
mata.
A tarefa é difícil e, às vezes, até perigosa: entrar na floresta
fechada em busca das copaibeiras - as árvores que produzem o óleo. O que
chama a atenção é a diversidade de plantas numa área de mata primária,
numa das regiões mais preservadas da Amazônia. O trabalho com copaíba
exige resistência. Isso porque as copaibeiras costumam ficar espalhadas
na imensidão da floresta - distantes umas das outras.
Estudos indicam que uma copaibeira chega a viver mais de 300 anos na
floresta. Existem várias espécies no Brasil. Na Amazônia, a mais comum é
a Copaifera multijuga, também conhecida como copal e pau de óleo.
Formado por muitas substâncias, o produto é eficiente no combate a
germes e tem qualidades aromáticas. Por isso, entra na fabricação
sabonetes, xampus, cremes, perfumes.
O manejo, feito com cuidado,não prejudica a saúde da árvore. Em cerca
de um ano, a copaibeira recupera o mesmo volume de óleo. Com o serviço
terminado, os produtores fecham o furo com um pedaço de madeira. Num dia
de floresta, eles exploram entre 15 e 20 copaibeiras.
Apesar de ser tradicional, essa atividade só começou a ganhar fôlego
nos últimos anos. Foi quando os ribeirinhos fundaram uma cooperativa e
firmaram contrato com uma indústria de cosméticos - que passou a comprar
o óleo de maneira regular.
Nessa fase, os produtores receberam assistência técnica e apoio de
entidades como a Agência de Desenvolvimento Sustentável do Amazonas, do
governo estadual. Atualmente, toda produção de óleo é levada para o
galpão da cooperativa, em Manicoré.
Assim que chega, o produto é pesado, coado e o pagamento é feito na
hora, em dinheiro vivo. Para cada quilo de óleo o produtor recebe R$ 17.
A coleta da copaíba faz parte do dia-a-dia de quarenta cooperados. Em
2012, a venda do óleo gerou uma receita de R$ 1.200 para cada um. Um
dinheiro extra, que complementa o rendimento de atividades consagradas
como castanha e borracha.
Fonte: Globo Natureza
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